O ar entre campos: as invenções do cinema de entrevista na última década

Por onde andou o cinema de entrevista brasileiro na última década? O que aconteceu depois da morte de Eduardo Coutinho em 2014? O que se deu depois que ele, que subiu um edifício dedicado a esse cinema, decidiu dinamitá-lo, em partes, nas vigas e colunas que o deixavam de pé, sobrando afinal as paredes esburacadas e bambas, bem ao seu gosto pelo imperfeito, o impuro, o momentâneo, o passageiro? A partir de Santo Forte (1999), Coutinho se dedicou a filmes estruturados pela sequência de personagens falando para… CONTINUA

Ao limite do desespero

Na mesma semana do lançamento de Vaga Carne e Sete Anos em Maio, Regina Duarte saiu da Secretaria Cultura e foi para a Cinemateca. O crítico Fábio Andrade estava certo ao dizer que “o cinema brasileiro é, hoje, menor do que seus filmes”, e não apenas pela barbárie bolsonarista – isso é óbvio – mas pela força propositiva da nossa filmografia recente. Minha semana também foi tumultuada e acabei não participando da conversa em torno dos filmes (realizada quarta e publicada ontem). Mas achei ótimo… CONTINUA

Uma aprendizagem: prosa sobre Sete anos em maio e Vaga carne

A ideia de trabalhar coletivamente tem orientado a Cinética na busca de novos diálogos e caminhos junto aos filmes. São oportunidades de conversarmos entre nós e com os filmes, chances de praticar conhecimentos, reconhecimentos e desconhecimentos. Aproveitamos o lançamento recente dos médias Sete anos em maio e Vaga carne – ambos com críticas publicadas aqui – para fazer este diálogo que se segue. A ideia é que possamos, via escrita coletiva, experimentar contágios, respostas, discordâncias, buscando assim falar de maneira multidimensional dos filmes e, em… CONTINUA

O trauma, a fala

“O pior é essa raiva, que nunca passa.” Desde A vizinhança do tigre (2014), Affonso Uchôa vem compondo um repertório de vivências marginais ancoradas no universo masculino. A começar pelos adolescentes deste último filme, cultivando uma liberdade ociosa na qual a zombaria e a alopração funcionavam como expressão de camaradagem. De maneira muito diferente, Arábia (codirigido com João Dumans, 2017) também lidava com um mito que poderíamos chamar de “masculino”: aquele do homem sem amarras, avesso ao pertencimento do universo doméstico e cuja solidão anônima… CONTINUA

Fé árida

Sequizágua comunga dos desafios vividos pelo cinema brasileiro que mais recentemente inventou seus passeios entre real e ficcional a partir da aproximação ao cotidiano de territórios e sujeitos à margem dos holofotes midiáticos. Na busca por uma poética do convívio, retrabalhada em matéria de cinema, as obras formularam diferentes arranjos para o encontro criativo entre equipe de filmagem e pessoas filmadas. Ao se inserir nessa teia de experimentos, Sequizágua aponta novidades formais, ensaia caminhos plásticos e nos põe a questionar a energia que o filme… CONTINUA

O narrador

Arábia tem sido festejado por parte da crítica como o retorno do operário ao cinema brasileiro. O que singulariza o protagonista do filme no contexto do cinema feito hoje no país, no entanto, talvez seja menos sua condição de trabalhador de fábrica, que o fato de ser este um personagem narrador. Cristiano (Aristides de Souza) é um operário de uma indústria de alumínio em Ouro Preto que, convidado a contar “algo importante” de sua vida pelo grupo de teatro da fábrica, escreve em um caderno… CONTINUA

Crônicas de Tiradentes: 1. Em torno do singular

Chego a Tiradentes este ano depois de dois anos e meio realizando um estudo panorâmico sobre o cinema brasileiro independente, comumente conhecido como novíssimo cinema brasileiro, o que cria para mim uma situação curiosa. Volto a um contexto que me é muito próximo, com novos filmes de cineastas os quais mergulhei sistematicamente nos últimos trinta meses, como Adirley Queirós, Affonso Uchoa, Rodrigo de Oliveira, Luiz Pretti; ao mesmo tempo em que as diversas mostras do festival este ano trazem cineastas e obras sobre os quais… CONTINUA

O cinema canvas e o último respiro

Três prévias, Lumière: 1. Laveuses sur la rivière (1897) Ninguém duvida do esmero cênico dos primeiros filmes dos Lumière, mas este filme-plano, especificamente, parece destoante do imaginário que os irmãos fundadores evocam. As costumeiras linhas diagonais que denotam uma espacialidade mais aprofundada por entre camadas – primeiro, segundo, terceiro plano – dão lugar a uma impressão de achatamento, como uma superfície bidimensional. Sabemos que os elementos da parte inferior da imagem estão mais próximos do que os da parte superior, mas a distância é pouco… CONTINUA