“Na mão de favelado, é mó guela”

Baronesa, de Juliana Antunes, é um filme sem profundidade de campo. O que há para acontecer acontece, aqui, logo à nossa frente, com a cor barrenta do tijolo tampando o fundo, o mundo. O que interessa são estas duas personagens cativantes, Leidiane e Andreia, e como elas se relacionam com seus filhos, com Negão, com a comunidade. Perpassaremos quase o filme inteiro escutando suas conversas sobre banalidades, às vezes barra-pesada, mas invariavelmente coisas do dia a dia. É a palavra que abre as portas para… CONTINUA

Onde jaz a brisa?

A sessão de exibição de Antes do Fim, de Cristiano Burlan, frisava logo nos seus créditos ,que se tratava de um work in progress; ou seja, um “corte” inicial, ainda em finalização, em desalinho – seja no delinear um tanto incerto entre cenas, ou em detalhes técnicos e questões sensíveis que o filme já levanta e pode vir a aprimorar. A primeira pergunta que se faz diante desse contexto é mais de uma metacrítica: seria válido traçar uma aproximação de um ensaio e de um… CONTINUA

Como ocupar uma abstração?

Filmes e documentários de, sobre e com ocupações são motes recorrentes no cinema brasileiro contemporâneo. Desde À Margem do Concreto (2006), de Evaldo Mocarzel, até obras mais atuais, como o curta O Teto sobre Nós (2015), de Bruno Carboni, costuma-se acompanhar o dia-a- dia e as motivações dos movimentos sociais que reivindicam moradia nas metrópoles derruídas pela especulação imobiliária. São filmes que revelam às câmeras um lado oculto, obscuro, desconhecido e alinham-se diretamente a uma causa, um tanto ideal, um tanto pragmática, ou mesmo emergencial,… CONTINUA

Heróis de lugar nenhum

Daniel Blake (Dave Johns) e Chesley “Sully” Sullenberger (Tom Hanks) são de mundos diferentes, com demandas, ações, desejos e ilusões diferentes. Acima de tudo, eles vêm de filmes diferentes. Algo, porém, parece uni-los em alguma medida: o caminho de transfiguração entre serem sujeitos ordinários e, por força de circunstâncias para além de suas vontades, tornarem-se sujeitos extraordinários. Tanto em Eu, Daniel Blake (2016) quanto em Sully – O Herói do Rio Hudson (2016) tenta-se atingir certa expiação por meio da cumplicidade e adesão do espectador… CONTINUA

O filho que é a mãe

Zilhões de eons atrás, quando patrulhas do politicamente correto ainda não haviam tomado a galáxia, certa homossexualidade masculina era vista como uma tentativa do individuo de ser a mãe, tomar o lugar simbólico do seu primeiro amor. Esse conceito (ou preconceito?) abarcava desde o machismo chauvinista até a psicanálise de botequim (não existe psicanálise fora do botequim). Padres, médicos e policiais acreditavam que o sujeito alucinava uma “mulher ideal” e, em vez de possuir a figura feminina e arrastá-la para a alcova, embatucava na ideia… CONTINUA

A vertigem do desespero

Enquanto soam os acordes dissonantes e as imagens justapostas de “Alegria, Alegria”, uma outra forma de colagem começa a se engendrar no filme que se inicia. A canção de Caetano dá o tom de uma aventura cinematográfica vertiginosa, ao mesmo tempo fragmentária, povoada de citações (visuais, sonoras, literárias) e portadora de uma energia íntegra, encorpada num ritmo febril. Viagem ao Fim do Mundo exibe uma forma dramatúrgica exuberante, sem precedentes e sem herdeiros no cinema brasileiro. Uma viagem de avião reúne uma fauna insólita –… CONTINUA