O abandono da política

Neblinas. Fumaças artificiais. O cinza das penumbras esticando-se por uma cidade. É no mínimo inquietante ver como essas imagens são similares, se repetem e se complementam em três obras aparentemente tão distantes como 300 Milhas, Alipato – a Brevíssima Vida de um Malandro e Penúmbria. Em formatos diversos, esses três filmes traduzem em cenas, ora documentais, ora ficcionais, realidades imediatas vividas por países como Síria, Filipinas e Portugal. Em comum, a falta de horizontes, certos flertes com a distopia, e uma maneira de olhar para… CONTINUA

O Paraíso segundo Murnau

Tabu, último trabalho de F.W. Murnau, morto em acidente automobilístico dias antes da estreia do filme, em 1931, encerra a carreira do diretor como a nota final de uma trajetória cinematográfica: a depuração de um estilo e de um olhar que acabam protocolando, em quase metalinguagem, a escrita de seu criador e, também, a do cinema até ali. A trágica história de amor entre Matahi e Reri, filmada in loco no Pacífico Sul e baseada numa iconografia e numa pulsação motora típicas dos contos de… CONTINUA

Imagens contra a rua

Existem imagens que gritam. Existem outras, não menos fortes, estridentes, ou inquietantes que conotam silêncio, introspecção. Presentes numa mesma sessão, os curtas Nunca é Noite no Mapa (2016) e Na Missão, com Kadu (2016) possuem um precioso ponto em comum: em ambos a câmera em punho transforma-se num gesto de resistência possível. Mais do que isso: são filmes alinhados a movimentos sociais por reivindicações de moradia e resistência contra a gentrificação, como o Estelita, em Recife, e o Izidora, em Belo Horizonte. É pela câmera,… CONTINUA

A imagem interrompida e seu luto

Com um dispositivo bastante simples, Ignacio Agüero encontra a forma fílmica desses dois documentários. Vê-se um set de filmagem de um cineasta chileno. Ouve-se “corta”, desmonta-se o set e prepara-se, pragmaticamente, para a próxima sequência. Booms, câmera, conjuntos de três tabelas, sacos de areia e outros artefatos comuns aos sets; tudo desmonta-se, rearranja-se. Nesse exato instante, Ignacio surge no quadro, chama o diretor e faz uma pergunta bastante direta: “o que é o cinematográfico nesse teu filme?”. As respostas e as sentenças são as mais… CONTINUA

Jovens mulheres

Seria meio automático associar imediatamente Sofia Coppola ter apresentado seu novo longa em Cannes ao fato de que, nesse mesmo ano, o Festival exibiu um filme cheio de energia, todo ele encenado em torno de uma personagem feminina jovem (interpretado por uma atriz desconhecida, deixando uma marca fortíssima na tela), que se sente perdida e um tanto desamparada num mundo em que tudo parece tornar mais difícil a sua simples trajetória em passar para aquilo que é considerado como uma “produtiva idade adulta” – trabalho,… CONTINUA