Senhor… senhora!

São quase exatos três mil e quinhentos os quilômetros que inscrevem, desde as nascentes do fértil rio Missouri até os vales do estado do Oregon, um risco territorial e político apelidado “Trilha do Oregon”. Outrora utilizada como rota de peregrinação e comércio para imigrantes esperançosos por uma nova vida na costa oeste – o que, no território norteamericano suscita, evidentemente, a) a “implicitez” pornográfica dos jogos de (des)apropriação e aniquilação religiosa em relação aos ditos nativos, e b) a iniciativa sagrada do lucro como sócio… CONTINUA

O amor no instante

Neste mais recente O Sal das Lágrimas – e isto se mantivermos em mente a polissêmica constância de um diretor para quem a análise mais superficial acabaria por elencar pelo menos trinta filmes dedicados aos encontros amorosos desde meados dos anos sessenta – quando Geneviève, personagem de uma das três amantes principais de um certo Luc, diz-lhe que a separação “só parcial” deles, ainda que motivada pelo ingresso deste numa academia de altos estudos de marcenaria, findaria por separá-los de vez, ela não toma para… CONTINUA

A lógica da linha

Sob o desejo por um encantamento ensejado na artificiosa surpresa de nada saber de antemão – possível sobrevivente de um culto do mistério excitado e desviado de uma “vertente mística” do cinema –, ainda existem aqueles que escolhem não buscar ou estar abertos a qualquer informação prévia de um dado filme? Decerto que existem, e mais seguro ainda será a probabilidade de que este História de um Casamento, o mais recente Baumbach, surja-lhes como um desafio. Porque se para aqueles que chegarem à obra sabendo… CONTINUA

A mítica do olhar interno

Uma câmera à mão, o marca-passo de um ritmo respiratório – e o tempo suficiente para que a impressão de uma trepidante subjetiva levante “seus” olhos do nível do chão para deixar adentrar, no quadro, um desconhecido em trânsito de alto fôlego. A curvatura de intromissão de um estrangeiro, da subjeção ao intuitivo, saltando do pulmão ao acompanhamento que se fará sobretudo olhar, é, ainda naquele preâmbulo, uma instalação do anonimato em mais de um sentido. E se a câmera aprende a ceder espaço para… CONTINUA

História do olho

A mais recente embarcação de James Gray lembra: não somos ingênuos a pelo menos três dos rastros mais distintivos, e, portanto, também, mais reiterativos, escorregadios, da chamada ficção científica como tratada pelo cinema – e não simplesmente porque a certos gêneros a assinatura de seus traços é uma docilidade aos olhos: 1) fala-se de uma noção de cidade, de um espaço reflexivo diante das relações que ali se travam e/ou não mais se travam, 2) é perceptível um arranjo de técnicas constituintes dos limites de… CONTINUA

A primeira pancada

Tamanha a estupefação diante da superficial profundidade do riso causado por Eugène Green neste curto – curto como um golpe – Como Fernando Pessoa Salvou Portugal, somente uma lenda pode introduzi-los, o filme, a gargalhada, a travessura custosa que é a poesia. Lembramos bem (grande parte de nós?) do monólito escuro de Stanley Kubrick à aurora da humanidade, do fantasmático ressoar de ‘Rosebud’ pelos corredores do império morto do magnata Charles Kane, da diabólica orquestração em agudos de pássaros assaltando uma cabine telefônica com uma… CONTINUA

O instante é um rio das almas perdidas

Nos lugares sérios em que as opiniões são como rochas que não racham nem tampouco se olham, lugares dos quais o cinema não só não está excluído, como talvez, aliás, já tenha se circunscrito em caricatas exemplaridades, tem se tornado terminantemente pueril e quase ofensivo sugerir que indivíduos são por vezes movidos por sentimentos que mal lhes cabem – sentimentos inchados, latentes, indivisíveis de muito do resto do que se faz. Digamos por um momento que este Hotel às Margens do Rio é um filme… CONTINUA

Latitudes e partidas: o historiador da história

É caso a se pensar e debruçar, este das tarefas impostas ao cinema “de cima”, digamos, pela crítica. Por seus outros agentes de fabricação também, decerto, mas sobretudo por ela. Melhor dito: pela crítica no decurso do tempo, posto que a sedimentação sobre o eco reverberado costuma ser mais sólida e persistente que aquela feita sobre a rocha que objeta, e não por sobrepujança das forças ditas conservadoras. Aquela (crítica) que disser de certos filmes que estes podem reescrever a história, por exemplo, ou mesmo… CONTINUA