Crônicas de Tiradentes: 5. Jogos de cena – a forca e a força da autoria

A) A forca da autoria Um plano zenital mostra uma mulher com seu bebê recém-nascido. Ela parece exausta, atônita, pode-se até mesmo questionar se não estaria morta. Um pequena morte sobreposta a uma nova vida. Momentos depois esta mulher irá afogar esta criança num riacho, observada à distância pela câmera, até sobrar apenas o lençol branco que cobria o bebê flutuando na água, como uma tela em branco encharcada de significado. Rebento, de André Morais, faz desse mote sua narrativa. Esta mulher caminha. Não se… CONTINUA

Gesto fundamental

Não dá para falar de Bandeira de Retalhos sem passar pelo violão de seu diretor. Na verdade, não dá para falar da história da arte moderna no Brasil sem ir a ele. Violão perdido, porque, arremessado com justiça a uma plateia estúpida, foi rebaixado a gesto desvairado dum artista em fúria. Enfurecido Sérgio Ricardo estava, ali no 3o Festival de Música Popular Brasileira da Record, em 1967, pois o mimado público o impedia de tocar “Beto Bom de Bola” por puro fricote de querer ouvir… CONTINUA

Crônicas de Tiradentes: 4. Por entre espaços

É interessante reunir no mesmo texto Dias Vazios, de Robney Bruno Almeida, e Baixo Centro, de Ewerton Belico e Samuel Marotta, ainda que sob certos riscos. Pois, evidentemente são filmes com pontos de partida e universos muito diferentes e aproximá-los pode apenas cair na armadilha de juntar duas obras exibidas no mesmo dia, no mesmo evento. Uma mera casualidade. Contudo, com todas as diferenças, ambos os filmes estão ancorados no espaço e no deslocamento como motor narrativo, algo que não é novo, nem exclusividade desses… CONTINUA

A imagem da vida

Todos os Paulos do Mundo começa com voz off de seu biografado recitando o mito da Torre de Babel, sobre a proliferação dos povos pela Terra, com suas línguas e culturas distintas confundindo-se, em desentendimento. Extraída de 500 Almas (2004), de Joel Pizzini, a fala aparece agora, neste longa de Rodrigo de Oliveira e Gustavo Ribeiro, imantada ao começo de A Vida Provisória (1968), de Maurício Gomes Leite. Na cena, um plongée avista a cidade do alto e mergulha até Paulo José, que assiste mais… CONTINUA

Crônicas de Tiradentes: 3. Novos engajamentos

Em 2015 escrevi um texto discutindo a reconfiguração de forças ideológicas no cinema brasileiro que se avizinhava a partir de minhas percepções da cobertura do Festival de Brasília de 2014, quando Branco Sai Preto Fica, de Adirley Queirós, ganhou o principal prêmio do evento e, num gesto histórico, anunciou a divisão da premiação em dinheiro com os outros filmes em competição. Foi o ano da participação, além do filme de Queirós, de Ventos de Agosto, de Gabriel Mascaro, Brasil S/A, de Marcelo Pedroso, Pingo D’Água,… CONTINUA

Crônicas de Tiradentes: 2. Perdidos e malditos

Madrigal para um Poeta Vivo apresenta, logo de início, um panorama muito simples e claro. Tico, o poeta do título, surge na escuridão carregando um foco de luz e calor que servirá para acender uma fogueira. Em seguida, a equipe surge no meio de uma paisagem florestal andando pelos becos naturais da mata guiados pelo protagonista, antes de letreiros com os versos de Louco (Hora de Delírio), de Junqueira Freire, e um prólogo que apresenta o coveiro escritor e dá a informação de sua morte.… CONTINUA

Crônicas de Tiradentes: 1. Em torno do singular

Chego a Tiradentes este ano depois de dois anos e meio realizando um estudo panorâmico sobre o cinema brasileiro independente, comumente conhecido como novíssimo cinema brasileiro, o que cria para mim uma situação curiosa. Volto a um contexto que me é muito próximo, com novos filmes de cineastas os quais mergulhei sistematicamente nos últimos trinta meses, como Adirley Queirós, Affonso Uchoa, Rodrigo de Oliveira, Luiz Pretti; ao mesmo tempo em que as diversas mostras do festival este ano trazem cineastas e obras sobre os quais… CONTINUA