textículos - cinema brasileiro
2010
A
Casa Verde, de Paulo Nascimento (Brasil, 2010)
por Eduardo Valente
Pode
parecer (e até é) um despropósito falar de Manoel de Oliveira
ao escrever sobre um filme como este A Casa Verde, mas
não se trata nem de longe de aproximar as obras. O fato é que
uma das frases mais sábias (dentre as muitas) já ditas pelo grande
cineasta português foi sua afirmação de que seus
filmes usavam uma linguagem cinematográfica tão frontal e direta
porque já tratavam de coisas muito complicadas, para ainda querer
complicar na sua forma. Pois este filme de Paulo Nascimento nos
faz pensar na frase porque parece inconsciente de que, na enorme
incapacidade de realizar o mais simples (contar uma história,
dirigir atores, etc), se torna tão mais constrangedor ao optar
por ainda querer ser narrativamente complexo (incorporando uma
metalinguagem na figura do desenhista, que nunca justifica sua
existência em tela). Assim como dirige atores (e câmera) como
se estivesse registrando uma péssima peça infantil, onde vilões
e mocinhos são igualmente desprovidos de qualquer carisma, Nascimento
ainda se arvora de um desejo raso de “contemporaneidade”, com
uma discussão sobre virtualidades e ecologia que não passa de
oportunismo puro e simples. O fato é que temos aqui um pretenso
filme infantil que subestima enormemente o que é a inteligência
de uma criança, além de parecer ignorar tudo de bom que já se
fez no gênero não só no cinema (nacional e internacional), mas
até mesmo na TV brasileira. O fato é que, perto de qualquer
Sítio do Picapau Amarelo Castelo Rá Tim Bum ou mesmo Cocoricó,
A Casa Verde não seria nada mais do que um tremendo retrocesso
– só não o sendo de fato porque está fadado a ser esquecido antes
mesmo de ser assimilado.
Topografia de um Desnudo,
de Teresa Aguiar (Brasil, 2009)
por Filipe Furtado
Desde
os créditos iniciais, com depoimentos de jornalistas e historiadores,
Topografia de um Desnudo deixa clara a sua razão de existir:
resgatar a história da operação do governo Carlos Lacerda para
tirar os mendigos das ruas do Rio no começo dos anos 60. Só que
a diretora Teresa Aguiar opta um tanto surpreendentemente por
rechear o filme de elementos estranhos para um filme-denúncia,
como uma estrutura narrativa super-elaborada e digressões anti-realistas
(que ficam mais claras quando ela dedica o filme a Jean-Claude
Carriére). O filme tropeça especialmente na sua incapacidade de
sugerir o Rio do começo dos anos 60 (as tentativas de estabelecer
o momento se resumem a múltiplos planos da fachada do Copacabana
Palace) e nas tentativas de dar aos assassinatos dos mendigos
um grande peso no seu momento histórico. Sabemos bem das dificuldades
de fazer filmes de época com orçamentos enxutos, e de forma alguma
pretendemos diminuir a importância da história que Aguiar resgata,
mas a soma destes dois elementos rouba da “operação mata mendigos”
sua especificidade, e empurra o filme rumo à abstração. Quando
o filme termina com uma seqüência de policia militar espancando
manifestantes, como muitas outras que já vimos, resta pouco de
Topografia para além do genérico. Ao fim, os créditos trazem
de volta as entrevistas com especialistas e a despeito das suas
genuínas boas intenções não restam dúvidas de que mais do que
resgatar sua história, Topografia de um Desnudo a vampiriza.
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