Solidão e Fé, de Tatiana Lohmann (Brasil, 2010)
por Filipe Furtadp

Fascínio e distância

Solidão e Fé
é um filme preocupado em conjurar uma mitologia – no caso, a da figura do cowboy, em especial dentro do universo do rodeio. Desde o primeiro momento, através de uma narração em off em primeira pessoa (um tanto desastrada), a diretora Tatiana Lohmann tenta estabelecer um olhar de forasteira fascinada, embalado em imagens que se embebedam de uma iconografia bastante batida do que este meio representa. Só que Solidão e Fé soa menos assombrado pelo mundo que revela e mais por si mesmo. A fascinação pelo outro termina soando muito mais como uma celebração autopromocional do filme: o mundo do rodeio é maravilhoso porque Solidão e Fé o filma, e não por ele mesmo.

Lohmann constrói seu filme todo na dicotomia de dois elementos igualmente presentes no meio – a rudeza do macho e a religião – mas estabelece muito menos um contraste e mais duas narrativas paralelas. O que parece fascinar o filme é muito menos a figura do peão e mais uma idéia de homem rústico. No último ato, Solidão e Fé abandona aos poucos o rodeio para uma viagem regressiva em direção a alguns dos aspectos mais conservadores do meio. É como se o filme reconhecesse que o universo que supostamente lhe fascinou por cerca de hora ainda seja bem comportado demais para seus objetivos. Há mais força nestes momentos finais, como se Lohmann finalmente chegasse ao destino que tanto procurara, mas há também a impressão de que o filme desperdiçou o universo do rodeio (bem mais interessante do que ele apresenta), e com ele cerca de uma hora de projeção, antes de encontrar a rusticidade de uma espécie de peão original - que por alguma razão obscura lhe soa encantador.

Há alguns depoimentos fortes em sua frontalidade, e é inegável que a câmera de Lohmann finalmente se localize à vontade. Mas mesmo isto não é o suficiente. No seu último movimento, Solidão e Fé abandona mesmo a pequena cidade em direção aos boiadeiros que fazem travessias de gado, um outro universo que pode render um filme e que revela a limitação maior desta tentativa de construir um olhar sobre o mito do homem rústico: todos este tipos que desfilam pela câmera de Lohmann representam universos diferentes, não são uma linha evolutiva clara. Entre o boiadeiro e o peão de rodeio, há um espaço muito maior do que o olhar de Solidão e Fé é capaz de lidar.

Janeiro de 2011

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