O
Sequestro do Metrô (The Taking of Pelham 123), de Tony Scott (EUA,
2009) por Filipe Furtado Expressivo
rascunho
O Sequestro do Metrô é
remake de um sólido thriller de meados dos anos 70, marcante por
seus bons atores, trama amarrada e sobretudo um olhar apurado para Nova York da
época. Tratava-se de uma espécie de O Plano Perfeito da sua época – e o
filme de Spike Lee é um bom contraponto a este trabalho novo de Tony Scott. São
filmes superficialmente muito similares, porém com objetivos muito distantes.
E a distância entre os dois representa muito do porquê O Seqüestro do Metro
é um filme mais interessante que a média dos exercícios de gênero relativamente
comportados de Scott (Maré Vermelha, Inimigo de Estado, etc). Porque
se este O Seqüestro do Metro é mais do que só um filme sólido, isso acontece
justamente pela maneira como ele se apropria da sua posição de remake para
avançar o projeto cinematográfico de Scott. O Sequestro do Metrô – assim
como o original e o filme de Spike Lee – é essencialmente um filme de Nova York,
mas não um filme que busque uma Nova York autêntica e tente localizar seu frescor.
A estética de Scott é a do desgaste da imagem, e nisso o sotaque local do Sequestro
do Metrô de 1974 lhe é um objeto completamente estranho. O que entra em jogo
no filme de Scott é justamente a mutação do olhar sobre a grande metrópole urbana
nos 35 anos que o separam do original (a começar justamente por seu filme se apresentar
como um thriller urbano muito mais do que um thriller de Nova York). Nova
York nos é apresentada nos créditos iniciais pela mediação de “99 Problems” de
Jay-Z. A lógica narrativa é de que se trata, a princípio, de apenas mais um dia
na grande cidade – antes do mecanismo do thriller literalmente sequestrar
sua atenção. Só que não há nada de casual nas imagens de Scott, e, se é possível
extrair esta idéia da cidade simplesmente se movimentando incauta, isso se dá
exclusivamente pela mediação de hip hop mainstream contemporâneo que Jay-Z
representa tão bem. São pequenos momentos como estes que posicionam Scott bem
acima de seus similares. Por trás de suas imagens desgastadas fica a certeza de
que não há maior atalho para o imaginário americano sobre o grande centro urbano.
Se Spike Lee trabalha muito para preencher seu plano de extras locais, Scott reconhece
que nossa idéia de o que seria o sotaque de Nova York passa muito mais por uma
faixa como “99 Problems”. Se Lee é sem dúvida mais autêntico e direto, Scott se
ocupa muito mais dos muitos filtros que nos usamos para olhar este mesmo universo. Todo
o seu filme se equilibra, assim, sobre esta idéia de que no intervalo entre os
dois Seqüestros do Metro nossa percepção se alterou completamente. Não
que estejamos diante de um jogo estéril, em que é preciso conhecer o original
para entender as idéias ali expressas. Tudo se articula de forma clara nas imagens
de Scott, na forma como sua grande cidade se apresenta como uma idéia que nós
consumimos e/ou absorvemos. Um dos elementos mais expressivos do filme é justamente
como ele é capaz de nos apresentar todo um jogo de artifício e mediação basicamente
através da sua estética habitual, sem sobrecarregar o filme dos truques habituais
como câmeras de vigilância (até há uma subtrama envolvendo uma webcam,
mas que nunca ganha os contornos simbólicos esperados). Tony
Scott tenta há anos filmar um remake do Warriors de Walter Hill, um filme
de Nova York bem mais representativo e expansivo que O Sequestro do Metrô
original. Por vezes temos a sensação que este novo filme talvez seja um primeiro
rascunho deste projeto, escondido sobre a superfície de um filme mais convencional.
Como tal, ele não chega a altos tão impressionantes quanto os dois filmes anteriores
do diretor, mas reforça a sensação de que a obra de Scott só cresce em ambição.
Se for mesmo um rascunho, é uma primeira visita das mais expressivas a estas idéias
– e só nos resta aguardar ansiosos pela sua versão mais desenvolvida, no seu Warriors. Setembro
de 2009 editoria@revistacinetica.com.br
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