Quarto em Roma (Habitación
en Roma),
de Julio Medem (Espanha, 2010)
por Juliano Gomes
O
mesmo vazio
Não bastasse a insignificante existência do
original Na Cama, de Matiaz Bize, temos aqui um remake,
em língua inglesa, feito pelo diretor basco Julio Medem.
Esta versão, que usa a mesma estrutura de "filme de
casal de desconhecidos uma noite em um quarto", transforma
o casal do filme original em duas mulheres. O esforço de
Medem, ao contrário de Bize, é justificar o desafio
espacial do filme tecendo relações com o "lado
de fora", principalmente com a história - seja a história
oficial (representada pelas duas grandes telas que ocupam as paredes
do quarto, com as quais Medem força dezenas de metáforas
para o amor das duas durante o filme) ou a história particular
de cada uma, que aprece em formato de minidramas particulares,
com intuito de dar alguma curva emocional numa situação
onde há poucos elementos pra isso.
Por mais belas que sejam Elena Anaya e Natasha Yarovenko, e por
maior que seja o esforço de Medem de tornar este material
algo mais que um pornô soft elegante, Quarto
em Roma é acima de tudo um filme frio. E todo o esforço
da fotografia, dos temas musicais irritantemente repetitivos,
tudo confirma a tentativa de impor uma temperatura, uma química
real que não se realiza no filme. Ao invés de investir
em, digamos, um filme mais literalmente físico, explorando
a interação desses corpos nesse espaço determinado,
Medem quer transcendentalizar esse encontro de qualquer maneira,
a fórceps. Coloca seu filme em Roma, o compara com o teatro
de Pompéia e com a Ágora de Atenas, e tenta metaforizar
cada instante com algum elemento de cena, de maneira que aquilo
signifique alguma outra coisa que não uma noite de sexo
entre duas mulheres.
Com
isso, cria-se uma espécie de paradoxo, pois Medem parece
estar absolutamente incomodado com a premissa de seu próprio
filme: quer sempre sair do quarto, fazer ligações
com o fora, com o mundo, com o passado. Há uma atração
metafísica que parece brigar com um filme que nos mostra
cem minutos de duas mulheres completamente nuas dentro de uma quarto
de hotel. Medem, a cada cena tenta tornar "arte" o que
poderia ser um belo filme exploitation, e assim não
realiza nem um outro. O acúmulo de situações
inverossímeis beira o risível, na sua necessidade
de fortalecer uma estrutura melodramática que não
tem interesse porque não tem reflexos reais na relação
entre as duas protagonistas em nenhum momento. São como pequenos
esquetes, entremeados por cenas de sexo em espaços diferentes
do quarto, que tentam o tempo todo se tornar uma grande história
de amor. Medem, na tentativa de sacralizar o que era originalmente
nulo, acaba encontrando uma outra face do mesmo vazio, na medida
em que foge ao desafio que seu próprio filme lhe impunha.
Outubro
de 2010
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