in loco - cobertura dos festivais
Paraíso, Aqui Vou Eu,
de Cavi Borges e Walter Daguerre (Brasil, 2011)
por Thiago Brito
Gerações
perdidas
Francisco e Sara são
remanescentes da "geração perdida": aquela
que, com todos seus ideais, encontrou-se finalmente vencida e
frustrada perante a guinada à droit do Brasil.
Ele, um poeta, um idealista, que se vê desamparado de público,
sozinho; ela, uma professora com tendências liberais que,
quando o bicho pega, acaba se escondendo sob uma capa de conservadorismo.
Entre os dois, a nova geração: Penélope,
a estudante de cinema que vive a partir de outros princípios
- é mais ousada, se permite entregar-se a um certo
acaso - e que não sente a mesma tendência à
resignação que os outros dois protagonistas.
Apostando no chavão geracional - e visivelmente buscando
um contato imediato com uma público "jovem" -
Paraíso, Aqui Vou Eu acaba vítima de suas
próprias crenças. Por força alegórica,
talvez resultado do posicionamento "teatral" ao qual
o filme aparentemente aspira, parece que se crê necessário
um esquematismo absurdo entre aquilo que acreditam os velhos desiludidos,
e o sentido no qual uma nova geração caminha. Como
a ideia é o contato com este público jovem, o filme
imediatamente termina por escolher um lado da equação:
Penélope é elevada a um signo de libertação
e coragem. Mas o contato com o público jovem se dá
através de uma completa aderência a seus signos mais
claros - aos seus gostos musicais, suas gírias. De certo
modo, o filme de Cavi Borges e Walter Daguerre representa um projeto
de cinema muito próximo ao de As Melhores Coisas do
Mundo, onde o cinema se vê preso a uma circunstância
de pesquisa e espelhamento de uma determinada geração.
É como se, para se ter a atenção de alguém,
nós devêssemos necessariamente falar com ela sobre
ela, e não lhe propor um enigma, um desafio, aceitando
a diferença que existe entre aquele que fala e aquele que
ouve.
Ao
dar esse passo, o filme acaba destronando consideravelmente seus
outros dois protagonistas: Francisco e Sara são, na verdade,
a completa frustração. Como que atavicamente presos,
eles não conseguem encontrar a sua saída
para o impasse, e devem aceitar
uma dada circunstância e se adaptar a ela. Evidentemente,
o filme não se conclui tão drasticamente como um
panfleto de aceitação idealista dos novos tempos,
mas tampouco permite que suas situações sejam revertidas
completamente. Não aposta em um resultado que pudesse perturbar,
minimamente, os termos de sua equação: Francisco
e Sara, quando casados, queriam um filho; aparece Penélope,
que tem um caso com os dois - embora eles não tenham consciência
deste acaso - e termina grávida de Francisco. Então,
ou eles aceitam a oportunidade para "expandir" seus
horizontes e alcançarem alguma calma ou felicidade, ou
aquiescem ao conservadorismo de negar esta nova possibilidade
de convívio (uma vida a três).
Nestas duas equações, reside todo o problema de
um projeto cinematográfico que mais busca se adequar a
um público do que enfrentá-lo: ou é um, ou
é outro; ou se é prafrentex, ou se é
retaguarda - um esquematismo que cada vez mais se encontra em
descompasso com uma sociedade que se encara tanto física
quanto virtualmente. Uma das maiores
dificuldades para se entrar em contato com a juventude é
exatamente a sua característica anômala, informe.
É como se a juventude, e tudo o que vem com ela, só
existisse na sua afirmação, no seu estado de confronto
consigo mesmo e com o mundo. É como se, para se chegar
até ela, fosse preciso saber enfrentá-la, nem domando
nem ironizando, mas estampando rudemente suas forças e
carências. Um pouco como John Hughes, um pouco como Nicholas
Ray - o passo no abismo que Paraíso, Aqui Vou Eu
se recusou a dar.
Novembro de 2011
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