in loco - cobertura dos festivais
O Que Mais Quero (Lo
que mas quiero),
de Delfina Castagnino (Argentina, 2010)
por Eduardo Valente
Em
suspenso
Em seu longo plano-sequência inicial, em que suas
duas protagonistas aparecem no alto de uma paisagem natural vasta,
O Que Mais Quero revela não apenas sua escolha de procedimentos
(as duas, de costas para a câmera, falam longamente sobre muito
pouco), mas principalmente deixa pistas claras daquilo que busca
retratar. Isso porque, neste espaço que ocupam em relação ao fundo,
as duas personagens surgem em suspensão – o que pode-se dizer
que é o estado dominante do filme, e que ao longo do filme inequivocamente
vai se revelando mais e mais firme como sensação.
Aos poucos, vamos entendendo os diferentes motivos
de cada uma delas para esse estado que, sendo primeiro de tudo
um estado de espírito, se encarna no filme de maneira bastante
física, como nesse primeiro plano. Uma delas está voltando para
o lugar de onde vem seu pai, que morreu há pouco e deixou para
ela a responsabilidade de cuidar da sua madeireira; a outra está
numa relação amorosa que já dura 4 anos, e na qual enfrenta agora
um daqueles momentos em que nenhum dos dois dentro do casal sabe
exatamente o que quer – se sair, se continuar, e por que. As atrizes
que interpretam as duas personagens se utilizam muito bem de sua
presença comum, mas carismática, e o filme propõe um estilo de
interpretação que encontra seu ápice numa longa conversa entre
uma delas e um rapaz, sentados no capô de um carro: algo que passa
pelo pequeno gesto, mas que apenas se finge de naturalista, não
encenado.
De
fato, o filme se monta a partir de uma série de pequenas cenas
(pequenas em escopo, mas muitas vezes bastante longas em duração,
como a desse diálogo), as quais num primeiro momento (como na
já descrita cena inicial) parecem seguir um certo modelo observacional,
bastante corrente no cinema atual. No entanto, há que se passar
um pouco do nível mais direto de percepção e notar como O Que
Mais Quero vai urdindo com bastante sutileza e inteligência
o seu drama, tendo lugar tanto para um “boy meets girl” que se
imiscui no filme quase sem ser notado; quanto para um momento
de dramaticidade bastante frontal, quase inesperada (na cena em
que a filha vai pagar os empregados do pai). Assim, embora não
deixe de contar bastante com alguns daqueles que já vão aos poucos
se tornando autênticos clichês dos filmes “sensíveis” mais recentes
(como a indefectível “fuga para a floresta”), O Que Mais Quero
não o faz sem compreensão de algumas de suas armadilhas mais fáceis,
e até por isso consegue sucesso em juntar essa dimensão da aposta
na cena e na presença, com um processo de identificação e construção
de personagens e situações bastante firme.
Setembro de 2010
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