Olhos Azuis, de José Joffily
(Brasil, 2009)
por Francis Vogner dos Reis Estratégias
da má consciência
Se
hoje, no cinema brasileiro, existem desastres dos mais variados
estratos, um deles continua sendo primordial, apesar de mais tímido
em tempos recentes: a má consciência. É como
se não fosse possível fazer um filme sem que ele
fosse atravessado pelo fantasma de que a ficção
sempre está "doente do mundo". José Joffily
partilha desse ideário. Não há um filme seu
em que a sua responsabilidade pelo estado das coisas no mundo
não apareça elevando o tom de seus dramas com o
intuito de deixar tudo às claras, em conflitos um tanto
convulsivos. Acontece que Joffily gosta de thrillers: A Maldição
de Sanpaku, Achados e Perdidos e, agora, Olhos Azuis.
O problema é que ele não gosta o bastante, pois
ao invés de se aplicar ao filme, buscando a imersão
necessária que o filme de gênero pede, ele sobe o
tom sistematicamente para deixar claro que a crise dos seus personagens
é necessariamente a crise de seu mundo (trabalha na chave
do sintoma social como determinante em qualquer relação
e ação), polarizado entre a injustiça e a
justiça, a inocência e a culpa.
Em Olhos Azuis, o diretor concentra o filme em dois tempos:
um é a o trajeto do americano Marshall por Pernambuco procurando
uma garota, o outro se refere ao seu passado, quando agente do
Departamento de Imigração em um aeroporto dos Estados
Unidos. Quando o filme começa, parece que Joffily consegue
se interessar com algum entusiasmo pelos personagens e as relações
no departamento de imigração. Algo semelhante a
um filme policial B americano no que há de melhor: coloquialidade
e economia da ação. O problema é que, homeopaticamente,
as seqüências de sua busca por uma garota pelo interior
do Pernambuco (que seriam, na história, anos depois das
cenas do departamento de imigração) visam ser um
trajeto de busca de sentido. É justamente aí que
vemos vir à tona o velho José Joffily, com seus
conflitos de temperatura bastante elevada, como quando o personagem
de Irandir reage ao agente de imigração.
Esse desleixo dramático é fruto de um outro anseio,
mais sério, mais grave e mais profundo: a necessidade de
procurar um valor alheio ao filme para justificá-lo. E
esse valor passa, obrigatoriamente, pelos contrastes e fronteiras
no mundo e entre as pessoas. Não acredita em uma coisa
(o cinema) e não sabe como dar vazão à outra
(a questão social). Além de mau artesanato, é
pura demagogia.
Julho
de 2009
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