Meu Nome é Dindi, de Bruno Safadi (Brasil, 2007)
por Eduardo Valente

Desejo de cinema

Talvez seja importante se aproximar de Meu Nome é Dindi tendo algum conhecimento sobre o trajeto do seu diretor, Bruno Safadi. Ainda como estudante de cinema da UFF, Safadi se aproximou do cinema de Julio Bressane e Rogério Sganzerla, especificamente através do período em que ambos criaram a Bel Air (não por acaso o projeto do segundo longa do diretor é um documentário sobre esta experiência), tendo organizado uma mostra com estes filmes e a partir daí conhecido pessoalmente os dois, trabalhando como assistente de Bressane já no Filme de Amor. Se tentarmos entrar em Dindi a partir desta chave, conseguimos traçar alguns pontos de contato (até bastante óbvios num filme cujo elenco que tem como musa Djin Sganzerla, filha de Rogério e Helena Ignez, e a participação de Maria Gladys): principalmente podemos ver a relação pela estrutura de um filme absolutamente independente realizado através de seguidos planos-sequência em scope (que nos remetem tanto a Sem Essa, Aranha quanto a Copacabana Mon Amour, ambos de Sganzerla), mas também a relação do filme com a música popular – explicitada tanto no título/nome da personagem principal, como nas duas cenas em que os personagens aparecem em cena cantando.

No entanto, Safadi não é um simples emulador de Sganzerla e Bressane, como outros há por aí. Quem conhece sua produção em curtas reconhecerá em Dindi muito mais o que é especificamente seu do que aquilo que se conecta ao cinema destes dois ídolos. Isso porque o filme parece uma curiosa mistura do clima de seus três primeiros curtas: de Gosto que me Enrosco (1999), o interesse pela ambiência em um certo Rio de Janeiro decadente do centro da cidade, visto com grande intimidade mas também com certo distanciamento causado pela maneira pouco naturalista de filmar seus espaços e personagens; de Na Idade da Imagem (2002), existe uma atração pela violência que parece pronta a explodir no meio dos ambientes e cenas mais inesperados, uma forma de filmar os personagens em suas andanças pelos ambientes escuros e misteriosos; e, finalmente, de Uma estrela para Ioiô (2003), vem uma inegável aposta num afeto quase romântico, tanto pela imagem cinematográfica quanto na relação entre as personagens (a relação de Gustavo Falcão e Djin aqui espelha bastante a dele com Mariana Ximenes no curta), e que afirma a possibilidade do sonho (e do pesadelo) invadirem o banal pela linguagem cinematográfica.

Por tudo o acima descrito, Meu Nome é Dindi é um primeiro passo em longa-metragem absolutamente coerente com a trajetória e o universo pessoal do seu autor – assim como é afirmação de um cinema feito em grupo, tendo por um lado a aposta máxima na independência e por um outro o desejo do extremo capricho na linguagem (e nisso a foto de Lula Carvalho, a direção de arte de Moa Batsow e a trilha e desenho de som de Aurélio Dias nos fazem realmente pensar no Bressane mais recente, com o qual Safadi traça uma forte relação pessoal). Com tudo isso ficando bem claro na tela, não se pode dizer que Dindi é tanto um ponto de chegada (pois ainda sentimos bastante presente o tatear de uma dramaturgia, que por vezes se esgarça demais na construção das cenas, em que atores ou narrativa não acompanham o desejo de cinema), mas principalmente é um ponto de partida. Parece ser um primeiro passo no caminho do longa, de um jovem cineasta que se faz chegar ao formato na hora certa (ao contrário de tantos outros curta-metragistas que não conseguiram faze-lo): disposto a arriscar e com convicção razoável do que deseja fazer. Resta encontrar nos próximos trabalhos o acerto fino deste explosivo desejo de cinema, cuja potência já está lá na tela.

Setembro de 2007

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