in loco - cobertura do Festival do Rio

Lifting de Coração (Lifting de Corazón),
de Eliseo Subiela (Argentina/Espanha, 2006)
por Eduardo Valente

Coração do tamanho de um trem

Homem mais velho, casado, com filhos e prestes a virar avô, apaixona-se por mulher bem mais nova enquanto viaja a trabalho. Por conta desta nova paixão, ele vai se ver precisando reavaliar seu casamento e a vida tranqüila que leva. Voilá a sinopse de Lifting de Coração. Não se pode dizer, como vemos, que Eliseo Subiela esteja se aventurando por terras nunca dantes navegadas, afinal a descoberta da paixão tardia que coloca a vida estável em xeque é uma das variações mais exploradas das histórias de amor.

No entanto, uma das vantagens do filme do diretor argentino é justamente que ele demonstra o tempo todo ter uma boa medida do clichê que é a trama principal, e brinca com isso de maneira saudável – até porque não é só no cinema que este enredo é clichê, mas na própria vida também, e os personagens nos deixam isso claro (“o amor é paciente, a paixão é impaciente”). Adiciona uma certa graça ao dar ao seu protagonista a ocupação de cirurgião plástico, permitindo uma série de repercussões diretas da questão do envelhecimento (o filme começa com uma apresentação do médico numa aula que parece saída de um filme de horror), mas também não cai no erro de superdimensionar esta questão como se fosse uma grande novidade.

Subiela filma com considerável talento a sua história, a começar por dar igual atenção a todos os personagens diretamente envolvidos no triângulo amoroso que está no centro da história, o que faz com que acreditemos piamente nela. Filma com enorme generosidade seus personagens, e adiciona humor na pitada exata para não tornar o drama dos personagens nem auto-importante, nem chanchadesco. Além disso, sabe rechear de graça os personagens secundários, criando alguns tipos inesquecíveis (como o motorista de táxi argentino filósofo) ou simplesmente ridículos, na medida certa (o amante psicanalista da esposa).

Mas, o que mais impressiona em Subiela é sua capacidade de levar suas propostas até o fim, mesmo quando elas se aproximam bastante do brega ou do humor rasgado. Sempre que ele faz isso, sem piscar, o espectador não tem opção além de comprar o jogo dele – visto que claramente ele o compra sem titubear. Em especial, isso é marcante no primeiro beijo do doutor Ruiz e Delia, a jovem argentina, onde temos uma longa série de cortes em movimento, que vão do aeroporto para a cama da casa dela. Também vale para a clássica cena cômica do encontro dos casais de amantes no restaurante – uma variação tão usada que achamos que cairá no lugar-comum, mas que Subiela subverte mais de uma vez.

E assim ele vai, de cena em cena, conquistando o espectador com seu cinema que não se propõe a nada mais do que recriar com algum frescor os entrechos amorosos que assombram homens e mulheres desde que o mundo é mundo. Pouca pretensão? Talvez, mas solucionar esta pequena obra com a delicadeza e o olho atento que Subiela demonstra também não deve ser considerado feito desprezível.


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