in loco - 38o festival de gramado
Abertura:
o espectro do espírito de porco
por Francis
Vogner dos Reis
A
vinheta de abertura do festival, no primeiro dia, compunha uma
propaganda de resultados. Quantidade de filmes, de horas de sessão,
de espectadores, etc e etc. Parecia ser importante mostrar que
o festival está grande, e botando pra quebrar. Não
só o Festival de Gramado, mas os festivais de cinema de
modo geral vivem de números que festejam a vida dos filmes
brasileiros nesses festivais, filmes que muitas vezes não
acontecem para além desses mesmos festivais. No
cinema brasileiro, os festivais são ilhas de felicidade:
tudo dá certo, e igual à série Ilha
da Fantasia, onde todas as fantasias dos personagens são
só projeções que tentam responder às
frustrações do "real world". Aí
mora o perigo. A soma do desejo do "real world"
(o desejo das coisas darem certo) com a frieza e o pragmatismo
da realpolitik necessita da sublimação do
sentimento de engano: as coisas não andam bem, mas vamos
acreditar que os eventos "políticos" potencializam
nossa crença de que, no fim das contas, tudo vai dar certo.
Isso não é a lógica dos festivais, mas do
mundo do cinema, e do mundo como conflituoso terreno comum (o
terreno da política, claro). É assim com as instituições
democráticas e com o mercado.
Porém, não há vontade de falar
em política, até mesmo porque o significado de política
mais usual (este que falamos) tende a ser o do ajuste, o do arranjo,
o do conchavo necessário, o do jogo. A política
não como arte da pólis, mas restrita aos escritórios
de marketing. Esse blábláblá enfadonho do
pragmatismo e da política de resultados não é exclusividade
do cinema brasileiro, mas coisa disseminada no jogo político
contemporâneo de maneira geral. Algo que fez com que,
por exemplo, o primeiro debate dos presidenciáveis (ou
seja dos políticos), ocorrido dias depois da abertura,
fosse nulo - um não-debate, por assim dizer. Por isso a
ironia e as provocações do não-presidenciável
Plínio de Arruda Sampaio parece a única proposta
de debate possível, porque construiu o discurso em oposição
à política de resultados. Esse espírito político
fundamental chamaremos de "espírito de porco",
porque complica situações e causa constrangimentos
necessários. Os textos dessa
cobertura do 38º Festival de Cinema de Gramado estão,
sempre que necessário, sob o signo do espírito de
porco. São curtos, chegam atrasados na praça depois
de todo mundo já ter "dado a notícia"
e efetivamente determinado o "valor" dos filmes no mercado
especulativo do cinema brasileiro. Um mercado virtual de
idéias sobre possibilidades e resultados do cinema brasileiro.
Setembro de 2010
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