in loco - cobertura dos festivas
Aquário (Fish Tank), de Andrea Arnold (Inglaterra, 2009)
por Eduardo Valente

Aluna diluidora

É difícil não se pensar em Gus Van Sant ou nos irmãos Dardenne logo que começa Fish Tank. No primeiro, principalmente pela curiosa escolha do formato 4:3 (tela quadrada) para contar essa história de uma jovem bem de perto dela (e aqui e ali surgem uma câmera lenta que faz pensar em Paranoid Park, assim como planos do céu – diferentes dos de Van Sant, mas também uma lembrança); nos segundos, claro, porque hoje já é quase impossível não pensar nos irmãos belgas nessa onipresença da decupagem radicalizada da câmera na mão perto da personagem que a segue em qualquer velocidade que ela corra, os cortes no meio das cenas, etc.

Nunca é extremamente animador quando começamos um filme pensando em outros autores, mas, vá lá que seja, são autores fortes e cuja combinação num filme pode até render algo de inesperado. Infelizmente, porém, na medida em que Fish Tank vai mostrando suas verdadeiras intenções, uma e outra influência estética vão ficando para trás como matrizes realmente significantes para além de uma certa emulação, e Arnold vai nos fazendo pensar cada vez mais naqueles que se revelam seus verdadeiros “mestres”. Primeiro, pensamos no Mike Leigh dos primeiros anos – ainda que adaptado, é claro, do final dos anos 70 para o século XXI: um mesmo desejo de inspecionar uma certa realidade de uma classe social trabalhadora inglesa, através de um retrato “nu e cru” de relações humanas que, principalmente no seio da família, flerta o tempo todo com a crueldade e/ou a disfunção absoluta.

Mas, mais adiante fica claro que o papel que Lars Von Trier desempenhou como produtor do primeiro longa de Arnold (Red Road) acaba trazendo sua presença para cá como influência, bem mais até do que naquele primeiro filme. Só que do manipulador frio e calculista dos destinos de seus personagens que é Von Trier, Arnold herda o impulso mas não a honestidade, escondendo por trás de um realismo dardenniano com toques de deambulações vansantianos o que, ao fim e ao cabo, é pouco mais do que um conto moralista extremamente previsível, que ao fim assume mesmo um formato quase hollywoodiano (em termos de arco narrativo) de “trajeto positivo” onde cada personagem joga um papel bem claro e definido de função para que a personagem atinja o conhecimento e a superação que o filme espera dela, até como alívio do espectador bem comportado. Claro que cada leitor pode fazer da equação o seu próprio resultado de acordo com seu gosto, mas na conta deste que aqui escreve, algo que começa como Van Sant + Dardenne e termina como Mike Leigh X Von Trier (menos originalidade e honestidade), não pode ter ido muito bem na matemática do cinema.

Maio de 2009

editoria@revistacinetica.com.br


« Volta