in loco - cobertura dos festivais
Espiral, de Paulo Pons (Brasil, 2011)
por Raul Arthuso

RaniaEstratégias

Espiral parece um filme que cai na armadilha de suas ambições frente à grandeza de suas limitações. As ambições são gigantescas: filmar uma trama de mistério, com toques fantásticos, que quebre uma certa percepção linear dos fatos e das coisas, mantendo o suspense, e que ainda reflita sobre a própria criação ficcional. Paulo Pons recorre, então, a duas opções: primeiro, numa referência ao universo ficcional de Luís Buñuel, compõe uma história que mistura claramente O Discreto Charme da Burguesia com O Anjo Exterminador. No caso, sete desconhecidos estão numa casa sem saber o porquê e não saem dela por alguma razão, até que encontram o anfitrião morto em seu quarto e têm de se decidir o que fazer com ele.

A segunda opção é pelo uso recorrente de tela dividida, como em De Palma, num impulso de amenizar o corte e dar a idéia de uma narrativa em tempo real, sem recorrer ao, por vezes, mirabolante único plano-seqüência. Porém, se o uso da tela dividida encontra em De Palma uma forma de mostrar uma simultaneidade das coisas e uma forma irônica de chacoalhar a expectativa do público, aqui em Espiral raramente uma coisa ou outra acontece. Em geral, a tela está dividida mostrando dois personagens que ocupam o mesmo espaço, e usa-se o recurso em vez de uma montagem em campo-contracampo; ou ainda, um personagem anda de um espaço a outro, com a tela dividida mostrando sua saída do primeiro espaço e a entrada no segundo, quando seria até mesmo mais forte e interessante para o ritmo do filme manter a montagem linear das seqüências.

As opções de linguagem tornam-se, então, mera estratégia, o conceito estético subjugando a narração. A obviedade da referência parece uma tentativa de fugir do rótulo de “exercício formal”, mas ao mesmo tempo se inserir num outro rótulo, o “cinema cabeça” - como os realizados a partir de roteiros de Charlie Kaufman, porém com a desvantagem de que o roteirista americano tem um domínio de construção de cena e do desenvolvimento das personagens que vai além do mero artifício da convenção de um “cinema fantástico”, algo evidentemente em falta em Espiral.

Outubro de 2011

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