in loco - cobertura dos festivais
Edmond (idem), de Stuart Gordon (EUA,
2005)
por Francis Vogner dos Reis
Do quase acerto ao desastre completo
De H. P. Lovecraft para David Mamet. Esse foi
o passo que Stuart Gordon deu em Edmond, seu novo filme,
com argumento e roteiro de Mamet, que apresenta considerável
mudança de tom para um diretor que fez sensação na década de 80
com filmes de horror B como Re-Animator e Do Além
(ambos baseados em Lovecraft), dois trabalhos no mínimo interessantes
(ou mesmo realmente bons). Mas, este novo filme parece minar qualquer
possibilidade de atingir algum achado estético e dramático como
os que encontrávamos em Re-Animator.
Edmond é uma comédia de erros em que o executivo temperamental
Edmond Bruke larga a família e vai se aventurar nas ruas de uma
grande cidade em busca de sexo. Comédia de humor negro acanhada, que
busca uma legitimação de seu pudor no vazio existencial do protagonista
e, ao mesmo tempo em que parece ser uma sátira à rebeldia sociopata, leva
tudo realmente a sério. Só que Edmond é o tipo de sujeito insuportável
que barganha e reclama do preço do serviço das prostitutas, tem
idéias fixas, é racista e absolutamente teimoso e repetitivo.
Cada investida sua na madrugada de Nova York é uma situação constrangedora
nova, como por exemplo, com as prostitutas – que rende o que talvez
seja os únicos momentos de interesse do filme, porque existe ali
uma concepção mais elaborada, e consciente, de encenação –, ou
com os vigaristas e bandidos, momento em que atinge o máximo do
constrangimento.
Como
exame dos limites da sanidade do cidadão comum americano diante
das relações de exploração cotidianas, o filme se assemelha ao
dantesco Um Dia de Fúria, de Joel Schumacher: o resultado
é igualmente constrangedor, mas pior para Gordon, cineasta
mais regular que Schumacher. Neste filme, contudo, dá
a impressão de estar perdido, tentando realizar uma coisa com
a qual não revela um mínimo de afinidade. A série de situações
frustradas poderia ter força dramaticamente, porque o texto de
Mamet parece razoável (como é de costume em roteiros assinados
por ele e em alguns momentos dos filmes por ele dirigidos).
Mas o problema de Stuart Gordon é como colocar isso em cena.
Edmond é um filme careta, muito reverente ao roteiro. Respeita
demais o texto de Mamet e, por fim, acaba deixando de lado
todo o trabalho de mise-en-scène, que poderia ao menos
ter um mínimo de coragem.
Se na sua primeira metade, é um filme de
algumas escolhas infelizes e outras quase acertadas, o que se
segue, então, é um foco completamente equivocado. Gordon não
sabe construir uma ponte entre o tédio de Edmond, o personagem, e
a catarse que explode em sua trajetória. A partir da virada, o
protagonista arruma sentido pra suas atitudes, e é aí que o cineasta
se atrapalha porque muda o tom para tentar imprimir alguma verdade
às desventuras do personagem, enquanto aquilo originalmente carregava
um tom explícito de farsa. Gordon faz o oposto que Scorsese fez
em O Rei da Comédia e Depois de Horas, ou mesmo
daquilo que acontece nos episódios de Seinfeld: ele mantém
um distanciamento para depois observar de mais perto a paranóia
de seus personagens e sua busca por explicações. Edmond
é um exemplo acabado do que acontece quando um cineasta não embarca
na viagem proposta pelo filme: nem o roteiro de Mamet, nem o elenco
conseguem dar pontos extras ao filme que, por fim, acaba sendo
um verdadeiro desastre.
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