Bem-vindos à primavera do cinema
por Cléber Eduardo, Eduardo Valente
e Felipe Bragança
CINÉTICA adentra o mês de setembro com quatro
meses de vida e um novo desafio para encarar diante da agenda
do cinema. Setembro é, afinal, o mês do Festival do Rio, que marca
o começo do período mais “agitado” do ano cinéfilo (sucedido,
em outubro, pela Mostra Internacional de São Paulo). É tempo de
prospecções, descobertas, confirmações.
Só quem é “mostreiro”, aquela categoria humana-cultural
capaz de suspender as atividades da vida cotidiana para se internar
no cinema por duas semanas, do imediato pós-almoço ao virar do
calendário, sabe como um festival esgota o corpo, afeta a percepção,
nos faz desplugar consideravelmente da realidade – embora passemos
a ter uma visão ampla dela, a realidade, por meio das diferentes
maneiras de mostrá-la, negá-la ou reiventá-la na tela. Nos casos
dos críticos-mostreiros, esse cansaço é acentuado pela às vezes
irrefreável necessidade de encontrarmos os amigos após a última
sessão, muitos deles redatores de sites, para apontarmos nossas
pequenas descobertas, manifestarmos nossas decepções, colocarmos
na mesa, entre um gole e outro, nossas diferenças de visão.
Como temos pautado a realização da CINÉTICA pelo
retrato mais claro possível das condições e fluxos de pensamento
dos seus redatores, queremos que a nossa cobertura destes eventos
reflita, de alguma maneira, este tempo especial em que eles se
dão. Teremos de abordar os filmes apresentados sem a pretensão
(ou a capacidade) de dar conta da totalidade da programação. Os
textos que disponibilizaremos, em alguma medida, serão frutos
dos interesses dos redatores – embora nos comprometamos a responder
aos títulos e diretores de maior apelo. Em textos menores, mais
amplos, ou em formato de diários dos redatores pelo oceano de
títulos, procuraremos ofertar ao leitor uma reação imediata.
Por se tratar de uma primeira impressão, comprometida
em seu rigor pela quantidade de filmes vistos no mesmo dia, salientamos
o caráter introdutório – ao menos dos textos sobre obras mais
complexas e importantes, que certamente pedirão futuras revisões
e ampliações, quando (e se) pudermos revê-los em condições mais
apropriadas. Festival é momento de discordâncias radicais e, em
CINÉTICA, tentaremos sempre expor pontos de vistas divergentes,
de modo a escancararmos as possibilidades de reação, opostas,
que um mesmo filme nos provocar – permitindo assim ao leitor o
acesso ao máximo de leituras possíveis que possam conectá-lo,
junto conosco, ao ritmo deste mês e pouco um tanto quanto “especial”.
* * *
Setembro também é um mês em que começamos a fazer
vários balanços. Em quatro meses de aventuras no ar, já temos
um mínimo de experiência acumulada, tanto pela simples realização
semanal da revista, quanto pelas respostas dos leitores e colegas,
e pela análise dos números de acessos da revista (vendo, com alegria,
que agosto foi o mês de maior acesso até agora – indicando que
nossas pequenas mudanças estão surtindo efeito). O leitor sentirá,
como imaginamos que já venha sentindo, outras mudanças graduais
– seja na dinâmica de atualizações, seja no formato dos textos,
seja mesmo na composição da redação da revista.
Uma das principais coisas que constatamos em nossas
constantes auto-avaliações foi que nossa principal promessa editorial
(dar resposta a todos os filmes brasileiros lançados em circuito)
tornou-se inviável de ser cumprida ao longo de 2006. Com a quantidade
cada vez maior de lançamentos, e com o tempo cada vez menor da
permanência em cartaz (temas que discutimos em particular na série
Cinema brasileiro para quem?), simplesmente não conseguimos
ver todos os filmes exibidos.
É importante assumirmos que alguns filmes despertam
menos interesse nos editores e redatores – até porque fazemos
todos crítica de maneira independente (leia-se, não remunerada
e por pura convicção em sua necessidade), e mantemos atividades
paralelas, profissionais ou acadêmicas, que não nos permitem a
dedicação em tempo integral à Cinética, como gostaríamos. Também
não é sempre que podemos pedir a nossos redatores (nem nos colocamos
essa tarefa como editores) que troquem uma sessão de um filme
sedutor como Miami Vice por uma de um filme que
não atiça suas curiosidades ou mesmo seu desejo cinéfilo, caso
de alguns filmes brasileiros recentes como Um Craque Chamado
Divino, O Homem Pode Voar e Odisséia Musical de
Gilberto Mendes, que, na correria de acompanhar os lançamentos
semanais, ficaram para trás nas prioridades de nossos críticos,
mesmo não havendo de nossa parte nenhuma recusa (a princípio ou
por princípios) a nenhum desses títulos.
O cinema brasileiro nos interessa em maior intensidade
como tema de discussão, mas, por sermos tão brasileiros quanto
críticos, tão mergulhados no cinema brasileiro como interessados
no cinema feito em qualquer país e em qualquer período histórico,
há momentos em que priorizamos o CINEMA (seja de Hollywood ou
de outras plagas). E, se temos nos mostrados duros com a produção
nacional analisada até o momento na revista é porque nossa visão
de cinema feito no país não se pauta por nacionalismo ou por estratégia
política de afirmação de uma produção, a qualquer custo estético.
Leia também nossos
editoriais anteriores.
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