Casseta e Planeta: Seus Problemas Acabaram,
de José Lavigne (Brasil, 2006)
por Eduardo Valente

Metendo os pés pelas mãos

O desafio não é pequeno: como criticar "cinematograficamente" uma obra que parece constantemente querer tudo, menos "ser cinema". Pois, ao fracasso de público da sua primeira incursão na tela grande (A Taça do Mundo é Nossa), os membros da trupe do Casseta e Planeta preferiram dar uma explicação simplória e conveniente: era diferente demais do programa de televisão. Portanto, façamos uma versão mais longa do programa de televisão, oras! Pois o fracasso, já configurado em menos de duas semanas de exibição, deixa claro que o diagnóstico só não foi mais impreciso do que o tratamento receitado.

Parece quase incrível que em nenhum momento tenha passado pela cabeça de ninguém averiguar o óbvio sobre o fracasso do primeiro filme: o roteiro era péssimo; o filme era filmado e montado sem qualquer senso de ritmo cômico; e, finalmente, aquilo que a TV disfarça e o cinema escancara - os Cassetas são, na maioria (o falecido Bussunda e Marcelo Madureira sendo as exceções) péssimos atores, e Maria Paula consegue ser pior ainda. Uma vez que quanto a tudo isso, nada se fez, o resultado não podia ser diferente: o segundo filme é tão ruim quanto o primeiro, apenas diferente - e o silêncio quase ensurdecedor que toma a sala de cinema ao longo da projeção deste é igualzinho ao que acontecia no primeiro. Ainda incapazes de perceber que estruturar uma narrativa em longa-metragem é mais do que apenas alinhavar uma série de esquetes a partir de uma idéia central frágil, e que uma boa piada a cada vinte minutos não bastam no cinema, de novo os Cassetas pagam mico.

A única real diferença do primeiro filme para este novo é a adição por trás das lentes de um "cineasta" cujo desprezo pelo conceito de cinema já estava claro no curta Suspiros Republicanos no Crepúsculo de um Império Tropical. Pois José Lavigne filma Seus Problemas Acabaram como quem derruba uma árvore a cada corte, no que é cuidadosamente secundado pela direção de arte e fotografia pastelizantes (curioso que o primeiro filme totalmente pago pela Globo Filmes em alguns anos, sem captação por leis de incentivo, tenha uma aparência tão porca, em oposição ao ideal do "padrão de qualidade global"). Com tanto desprezo pelos rudimentos da linguagem cinematográfica, não deixa de ser interessante que surja no meio do filme uma paródia de Cidade de Deus: parece sinal muito positivo que o cinema brasileiro já possa ter personagens tão marcantes no imaginário de um público que possam ser alvos de paródia - certamente não era o caso até pouco tempo, como no filme anterior em que os parodiados eram só os cineastas e os críticos.

Aos Cassetas fica a sugestão: eles que gostam tanto de Monty Python e de Mel Brooks (entre outros), façam como estes fizeram algumas vezes e nos apresentem um filme de fato da próxima vez. Senão, filmem um ator recitando as crônicas dominicais de Agamenon Mendes Pedreira, com a exibição das fotos da coluna em slides. Dá menos trabalho, e será certamente mais engraçado.


editoria@revistacinetica.com.br


« Volta