cartas dos leitores
Contando o final

Recebemos este mês talvez o mais curto email jamais recebido pela Cinética: sob o título “Sobre o filme O Nevoeiro”, chegou-nos a seguinte missiva:

Vocês contaram o final do filme e não avisaram.

Leandro Moraes

* * *

Claro que entendemos que a rispidez do comentário devia ser equivalente à irritação do leitor acima assinado – e é claro que não haveria resposta (pessoal ou na revista) que resolvesse esta irritação. No entanto, nos parece que a carta do Leandro é uma boa oportunidade para tratarmos do assunto de maneira mais ampla, para todos os leitores, porque na verdade ela tem a ver com o que esperamos (revista e leitores) do exercício da crítica.

Na Cinética, acreditamos que a palavra mais próxima do que queremos exercitar ao fazer a crítica de um filme é “análise” – mesmo que o termo nos coloque num certo território etimológico próximo de outros campos (a psicanálise entre eles) que não nos interessam tanto. Por isso mesmo, analisar um filme é falar da sua totalidade de enunciados, sejam estes enunciados audiovisuais ou de discurso/interpretação. Por isso mesmo, tratar do final de cada filme é mais do que natural: é quase essencial para nosso trabalho, porque de uma forma ou de outra é onde o realizador conclui o seu trabalho e, por mais que conclusão em cinema não tenha o mesmo significado que numa monografia ou numa investigação, ela é um aspecto dos mais importantes para a análise.

De maneira geral, nossa relação com a idéia de crítica é no sentido do diálogo: diálogo com a obra, mas também diálogo com o leitor. Por isso, embora não escrevamos pensando apenas neste ou naquele leitor (assim como não escrevemos somente sobre este ou aquele modelo de filme), se imaginamos uma relação ideal do leitor com o nosso trabalho é a de complementar o visionamento de um filme (ou programa de TV ou...). Não pensamos nunca nosso trabalho como guia de consumo, como sugestão de programa (exceção feita às dicas de programação na Mostra e Festival do Rio, feitos em outro formato e com propósito específico), por isso não é nosso costume nos preocupar com a idéia de poder ou não tratar de uma parte ou outra do filme.

Dito isso tudo, é praxe no mundo moderno da escrita moderna, principalmente na internet, usar o termo spoiler, justamente para se referir a estes momentos em que se conta algo do desenvolvimento narrativo de um filme. Embora tenha surgido na imprensa mais imediatista dos sites de “novidades” (que, não por acaso, vivem de spoilers), o termo migrou e hoje domina vários espaços de discussão sobre cinema. Se não passa pela nossa cabeça começar a pensar o cinema em termos de spoilers, porque a crítica é anterior a ele e sempre existiu dessa forma, também não me parece particularmente inteligente renegar a preocupação de algum leitor (como pode ser o caso do Leandro) que vem parar na Cinética em busca deste ou aquele tipo de informação e se incomoda com este tipo de aproximação. Por isso, prometemos ficar mais cuidadosos não em não mencionar os finais, como já explicado, mas em tentarmos da melhor maneira (para o leitor e para o texto) avisar quando o fizermos.

Eduardo Valente
editor

Outubro de 2008

editoria@revistacinetica.com.br


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