cartas dos leitores
Continuando Moscou

Li com atenção os quatro textos publicadas sobre o Moscou, e aqui é um exemplo de como a crítica pode fazer crescer uma obra. Pensando sobre o filme, e após ler as matérias, voltei àquela questão do que nos faz gostar tanto de um filme – e desse filme especificamente. O que há nele que me toca? Com quem me identifico e por que?

Logo no começo de Moscou, Coutinho nos propõe uma charada pela voz de Kike Diaz, o que torna a charada uma maior ainda espiral: ele diz algo como; "mas o coutinho deixou claro que nós não vamos apenas desconstruir -- temos que também construir" [dentro dessa obstrução proposta: ensaiar as três irmãs por três semanas apenas]. Logo em seguida, vemos os membros da companhia narrando problemas pessoais, conflitos pessoais que estão atravessando. Vemos apenas 4, ou 5 dos atores. Ensaio. Mais ensaio. Voltamos aos depoimentos, mas agora são atores interpretando conflitos pessoais antes narrados por outros atores num espaço diegético intencionalmente omitido. E, ao voltarmos aos ensaios, descobrimos esses conflitos narrados pelos atores presentes em seus personagens, habitando seus personagens, e então me emociono.

Me emociono com a cena propriamente dita, e me emociono ao perceber a construção de Coutinho, que nos faz entender (emocionalmente) que o único instrumento de trabalho dos atores são suas experiências. Nesse momento de descoberta, há um prazer enorme. Acredito que esse prazer venha de um encontro raro entre a descoberta intelectual (do gimmick construtivo de Coutinho) e a descoberta emocional; os personagens de Tchekov obtendo vida através dos personagens de Coutinho – os atores do galpão que se revelam entre eles e a nós. Como consequência, sinto-me mais próximo desses atores tão generosos, sinto um carinho profundo por eles, e no fim, sinto que o filme é uma pequena grande homenagem aos atores em geral. Essa simplicidade me deixa aliviado e feliz, e eu sinto um carinho profundo pelo Coutinho também.

Grande abraço
Fellipe Barbosa

* * *

Fellipe

Obrigado pelas palavras nesta carta. Que a experiência do filme continue através de nós, permitindo que se perpetue ainda mais com o espectador/leitor – não é mais do que isso, creio, que no fundo nós desejamos ao fazer crítica. Claro que um filme como Moscou ajuda muito a que se atinja, finalmente, este objetivo tão fugidio, afinal é ele quem de fato permite que este ciclo continue. Esperamos ansiosos pela estréia do filme, desde já, para que possamos levar ainda mais adiante isso tudo.

Abraços
Eduardo Valente
editor

Abril de 2009

editoria@revistacinetica.com.br

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