in loco Dia
5: Walter Salles (e Daniela Thomas); Woody Allen por
João Cândido Zacharias, colaboração especial
Linha de Passe,
de Walter Salles e Daniela Thomas (Brasil, 2008) – Competição
Linha
de Passe não se estrutura numa narrativa objetiva, não
tem exatamente uma história com começo-meio-fim a contar. O filme acontece no
espaço de cinco meses na vida de quatro irmãos, todos filhos da mesma mãe, mas
de pais diferentes e ausentes. A mãe esta grávida do quinto, que também já vai
nascer sem pai. Os irmãos são desenhados como personagens-símbolo desta realidade
brasileira: o motoboy, o crente e o aspirante a jogador de futebol – além do menor,
ainda em busca do pai, e da mãe, que é empregada doméstica. Essa família “como
qualquer outra” ganha em Linha de Passe uma historia única, com
o filme deixando forte sensação de que são personagens que existem alem dos 110
minutos de projeção. Por
muitos motivos além de ter Vinicius de Oliveira no elenco principal, sentimos
reflexos diretos de Central do Brasil nesse novo filme de Salles, mesmo
que por oposições. Pois, se em Central o personagem de Vinicius era o menino
perdido, em busca do pai, agora, somente o menor, a criança, ainda acredita nesse
encontro: os outros três já desistiram dessa procura, e a mãe já assumiu seu posto
duplo (“Eu sou pai e mãe de vocês”, grita ela durante uma briga). Entre Central
e Linha de Passe, o romantismo da procura parece ter se perdido em prol
de uma vida mais concreta. Fim de utopia? Não exatamente, pois cada um segue sua
existência, sua evolução própria: a obsessão de Dario pelo futebol, a enrolação
financeira de Dinho (ele próprio um pai ausente), as pregações de Denis, a procura
de Reginaldo pelo pai. Ainda que venha junto com Daniela
Thomas, Linha de Passe sem dúvida é um filme com a assinatura de Walter
Salles, mantendo aqui o olhar humanista do cineasta, que injeta de esperança o
final do filme. Se nenhum dos personagens passa por uma redenção direta e objetiva,
e nenhuma história tem um final selado, o ultimo plano do filme olha pra frente,
a partir daquelas evoluções tão particulares. É um filme cheio de coração (em
alguns momentos, um pouquinho demais), que bate com os personagens. E é muito
animador assistir a um novo filme de Walter Salles, que desde Central não mostrava
essa vitalidade e entrega.
* * * Vicky
Cristina Barcelona, de Woody Allen (EUA/Espanha, 2008)
– Fora de competição Desde
Melinda e Melinda, onde tratava diretamente do embate entre drama e comedia,
Woody Allen vem revezando os dois genêros em sua filmografia. Esse novo trabalho
é da vez da comedia, onde aliás o cineasta parece se sair bem melhor. Impregnado
por um certo ar espanhol (ainda que assumindo seu olhar de fora), o filme conta
as desventuras amorosas e sexuais da dupla Vicky e Cristina, duas americanas em
férias em Barcelona. Uma delas é certinha, noiva de um yuppie novaiorquino;
a outra, livre, artista e cheia de vontade de experimentar. Allen já não tem trazido
algo novo desde, talvez, Desconstruindo Harry, mas vê-lo voltar a alguns
de seus temas caros e sempre prazeroso. Vicky Cristina Barcelona é exatamente
isso: um prazer do começo ao fim; uma grande leveza, mesmo em seus momentos supostamente
mais pesados.
Maio
de 2008
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