plantão do YouTube Desliguem
os celulares, por favor... por Diego Assunção
“Those
Awful Hats”, de D.W. Griffith (EUA, 1909)O
filme em cartaz muitas vezes parece ser o que menos motiva o espectador comum
de multiplex a enfrentar uma sala de cinema. Às vezes o cinema serve para matar
o tempo enquanto a esposa faz compras, ou para fazer a digestão após uma alimentação
mortífera de “fast food”. As imagens projetadas parecem úteis para iluminar o
fundo do balde de pipocas, enfim, o filme é tão inútil que para um espectador
se portar como tal, em uma sessão de cinema, é necessário que as redes exibidoras
passem antes das sessões um vídeo de orientação, que pede ao público que desligue
os celulares e que se precisarem conversar, que conversem baixo. Em
1909, nos primórdios do cinema, David Wark Griffith (acima na foto) realizou um
curtíssimo filme de aproximadamente três minutos, chamado Those Awful Hats.
Muito antes de Peter Bogdanovich filmar a última sessão de cinema, Griffith estirou
um tripé na entrada de uma sala de cinema e fez sua profecia, com uma encenação
amalucada.
O pianista faz o acompanhamento sonoro das imagens, o público
compartilha a visão do filme até a chegada de um senhor de bigodes pontiagudos
e uma mulher com um carnavalesco chapéu. Ambos
perturbam a paz do lugar e abrem caminho para a entrada de mais uma meia dúzia
de mulheres, que vestem chapéus que mais parecem vasos de plantas. As mulheres
se sentam na primeira fileira e o caos se estabelece. Um acalentador gancho surge
dos céus para fazer justiça, ao retirar o chapéu de uma das mulheres. Outras,
com medo de serem atacadas pelo gancho, retiram os chapéus. Apenas uma mulher
resiste no alto de sua petulância, e o gancho a leva por inteiro. O resto dos
espectadores aplaudem com entusiasmo o desenlace. O curta acaba com uma recomendação:
“LADIES WILL PLEASE REMOVE THEIR HATS”. A fábula cômica de
Griffith fora realizada como “anúncio”, e tinha o mesmo intuito das orientações
sobre celulares que se vê hoje. O diferencial é que, em 1909, esse anúncio era
carregado de um exagero, característico do gênero cômico; hoje ele está mais para
um documentário, atual e aterrorizante – se, em 1909, o trecho do curta no qual
uma donzela desfila pelo corredor da sala, com seu chapéu imenso e de nariz empinado
parecia funcionar como “gag” do gênero, hoje é simplesmente a transcrição nua
e crua da entrada de alguma madame com suas sacolas de compras numa sala de cinema. Tão
atual que as redes de exibição deveriam adotar o curta antes das sessões, alterando
apenas a recomendação do final, trocar os chapéus por celulares. Mack Sennett
gesticulando num terno quadriculado é absolutamente mais fascinante do que qualquer
vinheta burocrática que se vê por aí. editoria@revistacinetica.com.br
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